sexta-feira, 29 de julho de 2011

Dormir na rua, em Setúbal

Foi notícia nos jornais de quase todo o mundo, aqui há uns tempos, o facto do inglês príncipe William ter dormido uma noite na rua, em solidariedade com os sem abrigo… Em Setúbal são dezenas os que fazem dos bancos de jardim, dos vãos de escada e recantos mais protegidos de edifícios e zonas da cidade, locais para dormir, de dia ou de noite. 

Velhos e jovens, nacionais e estrangeiros, transitórios ou permanentes, com problemas diversos relacionados com imigração, crise, desemprego, violência doméstica, miséria, pobreza, perda de família, doença, problemas psiquiátricos, alcoolismo, vadiagem, dependência da droga ou por mera opção pessoal, têm vindo a procurar a rua como última solução para sobreviver, muitas vezes passando despercebidos e invisíveis aos olhos da maioria das pessoas.

Quase todos desajustados, são também por muitos encarados como símbolos de uma ruptura com o modelo socioeconómico imposto, numa fuga a regras e normas, uma maneira de passar para o outro lado da sociedade capitalista… O certo é que a sociedade, nós todos, temos a nossa quota-parte de responsabilidade por esta situação: dormir na rua é inaceitável e é uma clara e inequívoca violação dos direitos humanos, sejam quais forem os motivos que os empurrou ou levou a escolher a rua como última medida. Muitas instituições da igreja têm vindo a substituir o que deveria ser deveres do Estado na solução desta forma extrema de exclusão ligada ao alojamento, situação que tende, dramaticamente, a aumentar na nossa cidade. Podemos constatar este facto diariamente, na nossa chamada sala de visitas, Praça de Bocage, onde nem a presença da autoridade ou a proximidade do Município intimida. Ou na nossa mal feitona Av. Luísa Todi, onde é fácil ver em pleno dia diversos indivíduos estendidos nos bancos e na relva, a dormirem o sono dos justos, completamente desconhecidos para o Plano Nacional de Apoio para a Exclusão e naturalmente invisíveis também para os nossos políticos locais…

Vi na semana passada um antigo conhecido a procurar vender determinada revista a quem passava e estranhei o facto: disse-me que a mãe tinha falecido e tinha sido despedido. Perdeu a residência, comeu o que tinha, vendeu anéis e agora roía os dedos. Vivia num banco, outras vezes numas escadas, com papelões como cama e agasalho, sem dignidade, envergonhado e com futuro incerto, enfrentando muitas e muitas vezes a hostilidade das pessoas, socorrendo-se amiúdo de pastorear carros para ganhar para a bucha diária. Infelizmente, mais um caso negro a juntar a tantos outros na radiografia desta cidade do rio azul!

Fonte: O Setubalense

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